PADRE JOSÉ FABRICIANO PEREIRA SERPA

Um pároco ilhéu

Padre José Fabriciano Pereira Serpa

Escondida atrás de morros, olhando para o mar, a Freguesia de Nossa Senhora das Necessidades e Santo Antônio, Santo Antônio de Lisboa na Ilha de Santa Catarina, tendo à esquerda Cacupé e à direita Sambaqui, conserva o casario açoriano, o espírito familiar e a tradição católica. A paróquia foi criada em 1750, uma das primeiras fundadas para o atendimento religioso dos imigrantes açorianos. Sua igreja matriz é a única que conserva os mesmos traços arquitetônicos do século XVIII.

Dois filhos padres, nela nascidos, por longo tempo ali paroquiaram: o Pe. Lourenço Rodrigues de Andrade (1762-1843) e o Pe. José Fabriciano Pereira Serpa. Pe. Lourenço representou Santa Catarina nas Cortes de Lisboa e, com a Independência, foi nomeado Senador vitalício do Império se fixando no Rio de Janeiro onde morreu e foi sepultado. Paroquiou a Freguesia de 1797 a 1821. O Pe. Serpa, chamado pelo povo de “Padre Zeca”, paroquiou de 1869 a 1922, mais de meio século.

José Fabriciano Pereira Serpa nasceu na Praia do Toló, em Sambaqui, em 22 de agosto de 1843, filho do Capitão José Pereira Serpa e de Maria Laureana de Andrade Serpa. Estudou no Seminário arquiepiscopal de São Salvador da Bahia, em cuja catedral foi ordenado presbítero pelo arcebispo Dom Manuel Joaquim da Silveira, em 02 de janeiro de 1869. Cantou a Primeira Missa em seu torrão natal em 20 de junho do mesmo ano, e dele foi nomeado pároco em 17 de agosto de 1869, ali permanecendo até sua morte, em 05 de outubro de 1922, após 53 anos de paroquiato.

A Ilha de Santa Catarina, pobre, com poucos moradores, tinha carência de padres. Por isso, Pe. José Serpa aceitou atender a outras freguesias, se locomovendo a cavalo, de canoa, a pé, de carroça. Deste modo, acumulou as comunidades paroquiais de Nossa Senhora da Conceição da Lagoa (1869-1879), São Francisco de Paula de Canasvieiras e São João Batista do Rio Vermelho (1871-1879; 1891-1922) e, no Continente fronteiriço, São Miguel da Terra Firme, Biguaçu (1873-1901).

Interessado pela política, foi suplente a Deputado Provincial na 22ª. Legislatura (1878-1879) e Deputado Provincial na 23ª. Legislatura (1880-1881).

A casa do padre era a casa de todos

Afirma o historiador Sérgio Luiz Ferreira que “a casa do padre Serpa era uma grande casa de alvenaria de um pavimento só, com janelas em arco, e se situava onde hoje está o salão da igreja. Padre José possuía escravos domésticos, e com ele residiam duas irmãs, Maria Leopoldina Serpa da Costa, viúva, e Maria Cândida Serpa, solteira, e vários sobrinhos. Saul Wagner, sobrinho-neto do Padre Serpa, foi criado em sua casa e pelos escravos era chamado de ‘Sinhozinho’”. Tinha inúmeros afilhados na região. Com a Lei Áurea de 1888, os escravos foram alforriados e permaneceram na casa do Pe. “Zeca”. Pode-se imaginar a movimentação dessa casa do padre e que era casa paroquial.

Além do zelo pastoral (na época significava dizer a Missa, batizar, confessar, encomendar e enterrar) a grande importância do Pe. Serpa era seu conhecimento de Homeopatia, ciência de que possuía boa biblioteca. Atendia doentes de toda a Ilha com suas receitas e xaropes, além de benzimentos “fortes” com a cruz, a chave do sacrário e água benta. Também exorcizava. Podemos dizer que, por meio século, aos pés de sua casa se desenvolvia a comunidade de Santo Antônio e, atrás dela, crescia o Norte da Ilha de Santa Catarina. Seu trabalho de padre e de médico homeopata foi de imensa valia para as pequenas comunidades de agricultores e pescadores que bordavam o litoral ilhéu.

Por gratidão a seu trabalho, em 14 de dezembro de 1912 recebeu o título de Cônego honorário do Cabido diocesano de Florianópolis. O Padre Zeca passou a ser o Cônego Serpa.

Deus o chamou aos 78 anos de vida e 53 de ministério presbiteral. Seu enterro repercutiu na capital catarinense e, á beira da cova, mereceu discurso do Desembargador José Arthur Boiteux. Oficiaram as exéquias Mons. Francisco Topp e Frei Evaristo Schürmann.

Cônego Serpa foi o último representante do antigo clero ilhéu, de sangue açoriano, nascido no Império e vivendo na República. Foi pai de seu povo e de sua comunidade.

Pe. José Artulino Besen

  1. #1 por leonardo gomes silva em 9 de dezembro de 2010 - 21:32

    Fiquei muito feliz em encontrar o nome de meu bisavô, Saul Wagner, neste seu histórico. Pai de minha avó, Anézia Wagner, esta casou-se com meu avô, Euclides Silva e nasceu meu pai, Ib Silva. Parabéns pela pesquisa e a família agradece. Possuo uma imagem de Saul Wagner, se for interessante me envie um email. Grato

  2. #2 por Maria Lucia Wagner em 17 de janeiro de 2011 - 22:14

    O historiador Sérgio já havia nos contado parte dessa bonita história. Cônego Serpa criou meu avô , Saul Wagner, que era seu sobrinho-neto, pois meu avô ficou órfão de mãe por ocasião do parto. Meu avô Saul Wagner, por sua vez, veio a ser chefe do posto fiscal de Sambaqui, casando-se com Maria do Sacramento Wagner, minha avó, com quem teve vários filhos, inclusive José Wagner, meu pai.Saul Wagner morreu aos 29 anos, deixando minha avó com seus 5 filhos para criar. A tradição política da família, contudo, continuou, pois, meu pai, José Wagner, deteve por várias legislaturas a vereança na cidade de Duque de Caxias.

  3. #3 por Guido em 6 de junho de 2011 - 22:55

    Como colaboração a sua pesquisa gostaria de sugerir uma pequena correção: Pe.José nasceu no dia 22 de Agosto mas de 1843 e não de 1844, a se considerar seu registro de Batismo na Matriz de Ns.Sra.das Necessidades, tal como consta no Livro de Batismo dos anos 1841-1856 à pagina 29. Um abraço,
    Guido

  4. #4 por Beatriz Cristina Lomar em 5 de julho de 2012 - 13:46

    Mais uma curiosidade sobre o sobrinho-neto do Pade Serpa , Saul Wagner, meu avô.

    Conforme informou minha prima, Lúcia Wagner, ele ocupou o cargo de guarda da Polícia Aduaneira de 1922 até 1933, quando faleceu com apena 29 anos de idade. Conforme informação da minha mãe, Linaura Wagner, ele falava Latim, Inglês e Francês.

    O cargo dele corresponderia hoje ao cargo, que também ocupo, de Auditor da Receita Federal.

  5. #5 por José Artulino Besen em 5 de julho de 2012 - 20:13

    Beatriz,
    muito obrigado pelas informações enviadas. Enriquecem a todos nós.

  6. #6 por Rosalia Pereira Serpa em 26 de outubro de 2020 - 08:58

    Muito interessante, saber a história de uma pessoa tão importante como esse padre , e que recebe o mesmo nome de minha família

  7. #7 por Jose de Jesus Wagner em 16 de maio de 2022 - 11:43

    Num país carecedor de bons exemplos, fica essa bela história de vida como prova que nossas atitudes podem ajudar o mundo ser bem melhor.

    Tenho a hora de ser neto de Saul Wagner.

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