IRINEU DE LYON: SOBRE A IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS

Igreja de S. Ireneu, Lyon.

Santo Irineu de Lyon é o grande mestre da teologia oriental, que lhe deve a explicação sobre a criação do homem à imagem e semelhança de Deus: Deus nos criou à sua imagem, mas o pecado enfraqueceu em nós a imagem divina, deixando-nos, porém, a nossa semelhança com o Criador. 

Irineu segue o caminho bíblico oferece como a melhor explicação: o homem é imagem de Deus na sua integridade, espírito e corpo, sem divisão. Vencer a tendência a sermos desencarnados: realçar a alma, a inteligência, deixando de lado a corporeidade. O homem é imagem de Deus na sua totalidade, carne e espírito, não é um anjo sem asas.

Irineu diz que Deus criou o homem à imagem do Verbo encarnado. O Espírito Santo é aquele que realiza este progresso, o dinamismo entre a imagem e a semelhança.  Não permite a interrupção do processo, buscando a restauração pela qual a semelhança recupera a imagem divina. Essa é a obra da vida espiritual do homem, cujo artífice é o Espírito Santo que amadurece

O Espírito Santo é o artífice da vida espiritual do homem, que o amadurece. No termo final dessa passagem, o homem, esquecendo as propriedades da carne, se tornará forma incorruptível, imortal. Assim, a restauração da imagem só pode ser realizada pela ação do Espírito Santo.

O ponto de partida é esse impulso (Fl 3,13-14): em certo sentido, o homem é um ser orientado para o Outro e aspira a superar-se, pois nunca está satisfeito. O pobre em nós busca tornar-se rico. O homem aspira ao que é maior do que ele e orienta-se ao totalmente outro. O “Deus desconhecido” (pregação de Paulo – At 17, 22-31) é a Imago Dei: não é um ideal, mas o princípio constitutivo do ser humano.

O fato da Encarnação é um fato primordial: sem ela, tudo passa a ser vã pretensão. Com ela, o homem se transforma na face humana de Deus. Por isso, a Encarnação não pode estar condicionada à queda, que aconteceria mesmo sem o pecado. O eros (eros = amor que necessita do outro) divino fez Deus descer à terra, fê-lo deixar o mundo do silêncio. O impulso que o homem tem no coração atinge o cume no Cristo histórico. O homem e Deus se olham no espelho e, em certo sentido, se conhecem (Pavel Evdokimov).

O homem, da semelhança à imagem de Deus

Irineu de Lyon (130-200), originário do Oriente, natural de Esmirna, foi discípulo de Policarpo que, por sua vez é discípulo de João. Irineu faz a ponte entre a teologia cristã e a era apostólica. Através dela atingimos o mundo dos apóstolos. Acompanhou um grupo de gregos imigrado na Gália, procurando libertá-los das heresias. Na idade adulta foi ordenado presbítero e depois eleito bispo de Lião. Ali redigiu sua obra fundamental “Adversus Haereses” (contra as heresias), sobre o Deus criador. Abandona a filosofia alexandrina, transmitindo o ensinamento bíblico.

Deus criou o homem “imperfeito”, mas nele incluiu um grande desejo, um impulso de perfeição. Há no homem um profundo desejo de perfeição.

A imperfeição se refere à temporalidade: o tempo tem um valor específico. Nele, tudo se desenvolve segundo certa ordem. Os seres nascem pequenos e passam a crescer. Deus se adapta a esta ordem do ser. Para Irineu, Adão e Eva não são trágicos, mas sim, ingênuos, sem experiência, e são modelos pedagógicos para o homem. A experiência significa amadurecimento. Antes de experimentar, o homem não sabe ir adiante.

Irineu fala do Adão criança mesmo tendo corpo de adulto, pela sua falta de experiência. Idade não fisiológica, mas psicológica: falta de discernimento. Adão ainda não tinha tido tempo para aprender. Mas, sua imperfeição, inocência, era transitória. Por ser ainda ingênua, Eva logo foi convencida pela serpente. Adão era destinado ao crescimento: Deus se serve de uma pedagogia diante do homem. Isso é importante para a espiritualidade: a perfeição nunca está no início do processo, mas é o fim desse processo. Deste modo, o pecado não é trágico: é aprendizado.

Há no homem uma “lei do progresso”: o que conta é atingir a perfeição. O progresso é constitutivo do homem. Deus coloca no homem o impulso, o desejo de perfeição, o sopro de vida. Assim, mesmo a expulsão do paraíso foi pedagógica, para que o homem se tornasse mais perfeito. O pecado e o exílio são temporais: o homem vencerá. Não se prender às consequências do pecado, mas ver a pedagogia, pela qual o homem procura a perfeição.

A queda provocou um enfraquecimento do espírito: a potência divina não foi destruída, mas enfraquecida. O tempo tem imenso valor, pois nele se realiza o progresso: do estado infantil, o homem se encaminha à idade adulta, à imagem de Cristo, o homem perfeito. Cristo é a imagem do Deus invisível (Cl 1,15).

O progresso está inscrito no ser do homem, mas Deus respeita a liberdade e o ritmo do homem. É um progresso lento, inerente ao ser corpóreo. Deus poderia ter dado a perfeição no início, mas o homem não seria capaz de acolhê-la. Assim, pela obra do Espírito, o homem e a mulher caminham sempre mais, da semelhança até a imagem de Deus. Essa é a perfeição fruto a obra de Cristo.

Santo Irineu ofereceu uma reflexão mais bíblica sobre a ação do Deus Criador. O homem e a mulher são grandes, porque essa é a vontade divina:

A glória de Deus é o homem vivo; e a vida do homem é a visão de Deus”.

Pe. José Artulino Besen

  1. #1 por Maria Besen em 28 de junho de 2019 - 21:59

    Que bom ver que publicaste mais um artigo da tua autoria. Já estava sentindo falta deles.

  2. #2 por Ivone Maria Koerich Coelho em 2 de julho de 2019 - 10:05

    Muito bonito, de Santo Irineu. Grande abraço Padre José.

  3. #3 por Lucio Espindola Santos em 5 de julho de 2019 - 09:27

    Aproveito este espaço para expressar milha alegria e minhas saudações ao Pe Besen pelos seu 43° ano de ordenação presbiteral. Que continuemos a ser abencoados por Deus através de seu ministério.
    Pe Lúcio Espíndola Santos, Guinea-Bissau.