2. O jejum

Jejua o quanto puderes diante do Senhor; o jejum purificará as tuas iniqüidades e os teus pecados (Is 6,7). Ele embeleza a alma, santifica os sentimentos, afasta os demônios, dispõe a aproximar-se de Deus. Quando tiveres comido uma vez ao dia, não desejes comer uma segunda vez a fim de não te tornares amante da abundância e não provocar perturbação no teu sentir. Se agires deste modo, poderás ter bens em grande quantidade para as boas obras e poderás mortificar as paixões do corpo. Mas, se acontecer um encontro de irmãos e for necessário que comas uma segunda e uma terceira vez, não te entristeças nem te abatas, mas antes, alegra-te por te submeteres à necessidade e, comendo uma segunda ou uma terceira vez, dá graças a Deus porque cumpriste a lei do amor e porque tiveste o próprio Deus como administrador de tua vida. Se vier uma doença física, e for necessário comer duas, três vezes ou mais ainda, não se entristeça o teu pensamento; não se devem manter as fadigas físicas de nosso estilo de vida também no tempo de doença, mas renunciar a algumas para conservar as forças para exercitar-nos nas fadigas de nosso estilo de vida. Quanto à abstinência dos alimentos, a palavra de Deus não nos proibiu comermos algumas, mas disse: “Eis, eu vos dei tudo, comei tudo como as ervas (cf. Gn 9,3), sem fazer distinções” (cf. 1Cor 10,25-26), e: Não é o que entra pela boca que contamina o homem (Mt 15,11). O abster-se dos alimentos será fruto de nossa escolha e da fadiga da alma.

Evágrio Monge,
Sumário de vida monástica, vol. I, pp. 42-43

[Os Pais] julgavam que um jejum diário fosse mais útil e favorável à pureza do que um jejum prolongado de três, quatro dias ou mesmo uma semana. Dizem que a um jejum prolongado sem medida segue muitas vezes um excesso de comida. Assim acontece que, por causa de uma abstinência exagerada, às vezes o corpo fica enfraquecido e se torna preguiçoso nas obras do espírito; e que, às vezes, o corpo, pesado pela abundância de alimentos, produz na alma acédia e falta de vontade.

Cassiano o Romano,
Ao bispo Castor, vol. I, p. 61

O jejum traz consigo alguma vanglória, mas não junto a Deus; ele, de fato, é um instrumento que dispõe à temperança aqueles que o querem. Os que enfrentam o combate espiritual não devem disso tirar motivo de vanglória, mas somente esperar na fé em Deus de alcançar nossa finalidade. Nem mesmo aqueles que são espertos numa arte encontram razão de orgulho de seus instrumentos, mas cada um deles espera a forma final da obra para que dela se manifeste a perfeição da arte.

Diadoco de Foticéia,
Discurso ascético 47

Se, enquanto de esforças para obter a virtude do jejum, desejas menos por fraqueza, com coração contrito dirige-te àquele que tudo provê e julga, rendendo-lhe graças. Se te mostras sempre humilde diante do Senhor, nunca te rebelarás contra ninguém.

João Carpácio,
Aos monges da Índia 12

Aquele que se aplica à virtude ou à meditação das palavras divinas não para a glória ou por um pretexto de cupidez (cf. 1Ts 2,5), ou para agradar aos homens, mas faz tudo, diz e pensa por amor de Deus, ele caminha no conhecimento ao longo do caminho da verdade. A palavra divina não costuma entreter-se em caminhos não retos, mesmo quando em certo sentido encontra o caminho preparado.

Se um jejua, se mantém afastado de um regime de vida que estimule as paixões e faz tudo aquilo que pode contribuir para afastá-lo do mal, esse preparou o caminho de que se falou; mas se dedicou-se a essas coisas por vanglória, cupidez, adulação, ou por qualquer outro motivo que não seja o desejo de agradar a Deus, ele não tornou retos os sentidos de Deus (cf. Is 40,3). Suportou a fadiga de preparar a estrada, mas não teve Deus que caminha em seus caminhos.

Máximo o Confessor,
Sobre a teologia 4,51-52

Belo é o jejum que se alegra com um alimento frugal, que se contenta com um alimento simples e que não procurar agradar aos homens.

Se jejuares até à noite, não comas depois até saciar-te para não reconstruíres aquilo que destruíste (cf. Gl 2,1-18).

Talássio Líbico,
Sobre a caridade 4,31-32

A submissão às paixões é eliminada pela alma através do jejum e da oração; o prazer passional através da vigília e do silêncio; a propensão às paixões através da paz interior, e a atenção e a libertação das paixões é produzida pela recordação de Deus.

Elias Presbítero,
Capítulos gnósticos 73

A primeira ação do corpo é o repouso, isto é, um modo de viver sem distrações, longe que qualquer preocupação relativa à vida… A segunda, um jejum moderado, isto é, o comer uma vez ao dia sem saciar-se, nutrindo-se de uma única espécie de alimento pouco custoso, que se pode encontrar sem se distrair e pelo qual a alma não prova desejo de verificar se existe um outro, de modo que possa vencer a gula, a glutonaria, o desejo insaciável e permanecer livre de distrações. Mas, ao mesmo tempo, deve-se evitar negar algum tipo de alimento rejeitando com maldade o que Deus fez muito bom (cf. Gn 1,31) e comer tudo de uma vez sem se interromper e pelo prazer, mas deve-se comer um só tipo de alimento por vez com moderação, dando glória a Deus sem abster-se de algum o julgando mau, como fazem os malditos heréticos. Beba-se o vinho no tempo oportuno; quando se é velho, doente e quando faz frio é muito útil, mas também aí em pequena medida. Quando se é jovem, faz calor e se goza de boa saúde é melhor beber água, mas também nesse caso deve-se tudo fazer para beber pouco; a sede, de fato, é a melhor ação corporal.

Pedro Damasceno,
Livro I, vol. III, p. 17-18

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