PADRE AUGUSTO SCHWIRLING

Missionário do Alto Capivari

Pe. Augusto Schwirling - desbravador do Alto Capivari

Pe. Augusto Schwirling – desbravador do Alto Capivari

Padre Augusto Schwirling inclui-se na cepa dos missionários incansáveis, corajosos, de resistência física, espiritual e moral a toda prova. Dele pode-se dizer que viveu no mato, nas clareiras onde se fundavam comunidades de imigrantes alemães e seus descendentes, em Santa Catarina. Parou apenas quando não podia mais continuar suas andanças missionárias e pastorais.

Nascido em Lichtenau, Westfália, em 25 de fevereiro de 1872, diocese de Paderborn, foi ordenado presbítero em 22 de março de 1895. Na Alemanha foi capelão em Guterslach, Halle e Langendreer.

Chegou ao Brasil em 1907, impulsionado pelo mesmo ardor missionário do Pe. Carlos Boegershausen (1833-1906), o primeiro pároco de Joinville, de quem foi vigário paroquial, mas destinado a percorrer as regiões distantes onde se fixavam os colonos alemães.

Sua vinda para o campo missionário foi irreversível e já em 22 de julho de 1910 recebeu a incardinação na diocese de Florianópolis. Fato original: em cinco de maio de 1930 o Vigário Geral de Paderborn pede notícias do Pe. Augusto, que deixando a diocese em 1907, não se sabia se teve incardinação ou não. Mais tarde Pe. Schwirling comenta que, sendo missionário, muitas coisas não seriam necessárias. Para que tudo ficasse em ordem, com data retroativa em 21 de janeiro de 1930 fez o juramento de pertencer perpetuamente à Arquidiocese de Florianópolis: em 29 de agosto de 1930, Paderborn envia a excardinação e, em 25 de setembro de 1930, Dom Joaquim o incardina na Arquidiocese de Florianópolis.

Generoso ímpeto missionário

Um ano após a chegada em Joinville, já estava na região do Capivari, um imenso sertão verde. Em 1º de agosto de 1909 celebrou a primeira Missa em Anitápolis e deu início à construção da capela. O Chefe interino do Núcleo Lauro Müller (Anitápolis) pede ao bispo que o nomeie professor de religião com a subvenção mensal de 200$000. A Comissão manda construir casa para escola e reserva lotes para o professor e sacerdote.

Em 30 de dezembro do mesmo ano foi nomeado Cura de Teresópolis, colônia fundada em 1860 e atendida pelos franciscanos até 1899.

Homem tomado pelo zelo do Bom Pastor, amplia seu campo de ação para além dos limites do Curato que, diga-se a verdade, eram muito indefinidos. Em 23 de dezembro de 1910 as capelas de Löffelscheidt e Vargem Grande passam a Teresópolis. Cavalo, charrete, pernas eram seu dia-a-dia. Tudo o que se referia aos colonos lhe interessava.

Em 18 de dezembro de 1916, cita os Núcleos coloniais assistidos por ele. Eram três: Anitápolis (federal), Rio Abaixo do Itajaí (Companhia Colonizadora catarinense) e Rio Novo (Rio Alferes – Alto Porto de Boa Vista). Pe. Augusto escreve que esse último Núcleo foi “improvisado por intrusos nacionais”, isto é, por brasileiros.

Em 1917 recebe um breve socorro do Pe. Carlos Füchtjohann, que logo se retirou, não resistindo à carga de trabalho.

Em relatório de 1918 cita mais detalhadamente as igrejas e capelas a que atendia: Matriz do Curato de Teresópolis; Capela de Santa Teresa do Itajaí do Sul, Capela de Bom Jesus do Barracão; Capela de Santa Brígida do Rio Novo; Capela de São Paulo do Braço do Norte – Pinheiro; Capela de Nossa Senhora da Assunção de Löffelscheidt; Capela de Nossa Senhora da Conceição de Rancho Queimado; Capela de São Bonifácio de Taquaras; Capela de Santa Isabel do Rio dos Bugres. Além desses espaços construídos, Pe. Schwirling celebrava em 30 Casas particulares, num território onde hoje se situam os municípios de Rancho Queimado, Anitápolis, São Bonifácio, Ituporanga, Vidal Ramos, Rio Fortuna, São Martinho e Armazém.

De dezembro de 1911 a junho de 1912 Pe. Schwirling esteve na Alemanha para recuperar a saúde e as forças e também para angariar recursos para as escolas paroquiais, ponto de honra em cada comunidade: não se entendia colônia alemã sem escola paroquial.

Fundador de comunidades

A exemplo do Pe. Guilherme Roer (1821-1891), que tinha encaminhado colonos para o Vale do Braço do Norte, Pe. Schwirling refaz o projeto, mas partindo do rio Maracujá que nasce em Anitápolis e deságua no Alto Vale do Rio Itajaí-mirim, percorrendo as regiões vizinhas em busca de terras melhores para os colonos alemães. Deve-se ao Pe. Schwirling o início do povoamento das regiões que hoje constituem Ituporanga, Vidal Ramos e Presidente Nereu, nas cabeceiras do Itajaí Mirim, no período de 1912 a 1928. Dá início à organização eclesiástica da imensa região, contando com o auxílio missionário ocasional do Padre Bernardo Bläsing e dos franciscanos Frei Húmilis e Frei Meinrado.

Esse pioneirismo esbarrou num obstáculo: a presença ancestral dos índios botocudos, ameaçados pela penetração tanto dos colonos que vinham do Alto Vale como dos que subiam pelo Itajaí-mirim procedentes de Brusque.

Assistimos, desse modo, às terríveis expedições de bugreiros, grupos de colonos pagos para literalmente caçar e matar índios, uma página triste da história catarinense. Pe. Schwirling, em seu zelo pelo bem-estar e segurança dos colonos, participou de algumas dessas expedições. Numa delas, afugentado pelos índios, caiu numa ribanceira, por pouco não morrendo. Sobrou-lhe uma cicatriz na testa. Eram pobres contra pobres, todos buscando a sobrevivência.

Preocupado com o desenvolvimento da comunidade de Teresópolis, com recursos que trouxera da Alemanha e a colaboração dos colonos, em 1920 fundou nela a primeira indústria: a SOCIEDADE COOPERATIVA DE THERESÓPOLIS – Refinação de Banha, Salsicharia, Fabricação de presuntos, compra e venda de todos os produtos coloniaes. A experiência não teve longa duração, pela dificuldade na colocação dos produtos, mas retrata o interesse do padre pelos seus colonos.

A messe é grande, poucos os operários

Em 1919, devido ao muito trabalho, pede o deslocamento do Pe. Ernesto Schulz de Orléans para auxiliar de Teresópolis, pois o sentia-se impotente diante da vastidão do campo apostólico. Não sendo atendido, em 1922, com dor no coração, pede a Dom Joaquim um outro posto, em qualquer local da diocese. É-lhe oferecida a Coadjutoria de Imaruí, Laguna, Quadro do Norte, sabendo-se que ele não aceitaria essa mudança.

A solução veio no mesmo ano: os franciscanos de Santo Amaro da Imperatriz assumem Teresópolis e Pe. Augusto fixa residência no Alto Capivari, São Bonifácio: por 23 anos (1922-1945) será o zeloso pastor de São Bonifácio, no Alto Capivari. Muitas vezes deve ter lembrado São Bonifácio, o apóstolo da Alemanha.

Em 1920 pede a Dom Joaquim o envio das Irmãs que tinha conseguido na Alemanha para residirem no Curato. Dom Joaquim responde, a seu modo, que as Irmãs já tinham sido fixadas em Vargem do Cedro, criado Curato em 1921. Creio que as próprias Irmãs tenham estranhado a solidão e as dificuldades de viver em Teresópolis. Era lugar para missionário corajoso.

Em 1921 os Padres dehonianos assumem o Curato de São Sebastião de Vargem do Cedro e Pe. Schwirling, para atendimento de algumas comunidades, de 1926 a 1932 será vigário encarregado do mesmo curato, com residência em São Bonifácio. Por sua vez, o dehoniano Pe. Gabriel Lux é o vigário. A situação geográfica complicada possibilitava esses arranjos de vigário e vigário encarregado simultâneos.

Em 1926 são reanexadas a Rodeio e Blumenau as capelas de Barracão (Ituporanga), desmembradas do Capivari.

Em 1935, Dom Joaquim fica sabendo que o Pe. Schwirling continua atendendo Anitápolis e até encaminhando a construção de casa paroquial e construindo igreja de tijolos em São Francisco de Sales de Maracujá (que pertencia a Rio Fortuna). Dom Joaquim pede que apresente provisão que o autorize a isso e lhe oferece Teresópolis, “vaga”, com os Freis sobrecarregados.

Pe. Augusto Schwirling em Azambuja - 1958

Pe. Augusto Schwirling em Azambuja – 1958

Preocupado e obediente, embaralhado mesmo sobre qual é o território de sua jurisdição, em dois de agosto de 1935 Pe. Schwirling pede esclarecimentos sobre qual é a sua paróquia. Seu raio de ação era tão vasto e cansativo que ele não sabia que Anitápolis e Rio Fortuna não eram mais de seu paroquiato. Com zelo de pastor, pensava que tendo faculdades de vigário poderia se embrenhar pelo imenso sertão de morros, vales e colinas. Por 10 anos atendera Anitápolis e depois da Guerra de 1918 a trocara com Taquaras (Barracão), Santa Teresa e Rio Abaixo porque “quis tocar a nossa boa mocidade para lá e não para Anitápolis, com muitos imigrantes não bons. Também as terras eram muito melhores em todas as condições no Rio Abaixo. Esse troco foi intermediado por meu coadjutor d’aquele tempo, Pe. Bernardo Bläsing, em Rio Fortuna”. Narra igualmente que entregou as capelas de São Martinho do Capivari e São José de Rio São João para Rio Fortuna, pois eram muito distantes de Teresópolis: 14 horas a cavalo. Assim também entregou Rio Abaixo (Ituporanga) aos franciscanos e aceitou novamente Anitápolis.

Na mesma carta, a respeito das construções, escreve a Dom Joaquim: quanto ao fato que a Cúria pede as plantas das Capelas, diz que ”nestes lugares retirados fora do comércio, pobrezinhos, não há profissionais (pedreiros, marceneiros, carpinteiros – nem sapateiros nem alfaiates, etc.) e se tiver não sabem fazer uma planta, e se tiver planta , não sabem executar”.

Então aceita a provisão para Teresópolis, pedindo comunicação sobre quais capelas paroquiar e onde residir. De Teresópolis a Capivari são 6 horas de viagem e para a capela de Santa Maria, mais 4 horas. E com freqüência deve ir a Vargem do Cedro celebrar para as Irmãs que não devem ficar duas semanas sem Missa: isso quando Pe. Gabriel Lux SCJ está visitando capelas.

Resumindo: Pe. Augusto passa a atender Teresópolis e Capivari (São Bonifácio).

Cansado e com problemas de saúde em 30 de março de 1937 pede e recebe licença para passar três meses na Alemanha a fim de encaminhar um herdeiro para os bens paternos, pois ele é o filho mais velho e dois irmãos tinham morrido na Guerra. Como desejasse visitar mais uma vez toda a Anitápolis e celebrar Pentecostes e Corpus Christi em São Bonifácio, embarcou em 15 de junho em São Francisco do Sul no vapor General Artigas.

De Lichtenau, em 22 de agosto de 1937, escreve que “arranjou com as Irmãs Dominicanas duas Irmãs professas e uma enfermeira; arrumou dois padres e estudantes de teologia no último ano, até terminarem os estudos no Brasil e aqui serem ordenados.

Em dois de setembro de 1937 o Secretário do Arcebispado responde: “O Sr. Arcebispo autoriza-o a trazer, dois Padres (não mais que dois), SEM COMPROMISSO DE COLOCAÇÃO, E SUJEITOS, EM TUDO, AO REGIME DESTA ARQUIDIOCESE. Seminaristas, não aceita, a menos que se comprometam a fazer o curso completo de Teologia, ou em Roma, ou em São Leopoldo”. Nada feito, portanto. Dom Joaquim não via com bons sentimentos povoar a Arquidiocese com clero alemão.

As Irmãs Dominicanas de Speyer vieram, mas Dom Joaquim as encaminhou para Araranguá, depois de breve passagem por Teresópolis e Capivari: mais um vez Pe. Augusto se vê sem a presença oportuna das religiosas. Mas não reclama. Tinha forte o sentido da obediência às autoridades.

Dos muitos trabalhos, pouca saúde

O velho guerreiro vê a fraqueza tomar conta do corpo. Em 31 de dezembro de 1939 escreve a Dom Joaquim que está para fazer 68 anos e que, ao arrancar um pé de mata-pasto teve um choque tão forte ao redor do coração que em 14 dias não podia mais trabalhar. Pede para ser aposentado em São Bonifácio e que Teresópolis e Anitápolis (50 km distante) sejam atendidas pelos Franciscanos. Em 5 de janeiro, o Secretário (Roberto Wirobek) escreve que “S. Excia. já tem um ‘padre prontinho’ que será coadjutor com residência em São Bonifácio para atender Teresópolis e Anitápolis”. E conclui, no típico estilo de Dom Joaquim: “Mas deixe-se de mata pasto; não vá o pasto virar em mata-pastor”.

Em 22 de junho de 1941 escreve à Cúria estar atacado de dor na anca esquerda, sendo assim custoso andar a cavalo, para não dizer impossível.

Em 18 de junho de 1943 dirige-se mais uma vez à Cúria, no fim de suas resistências físicas: “Não posso caminhar! Doe sempre mais a perna, no lugar abaixo do joelho, onde apanhei um coice do animal. Só deitado com a perna posso agüentar. Não se vê nada por fora, não parece encarnado, não inchado: decerto é uma Quetsihung no osso”.

Pe. Walmor de Castro era o padre prontinho. Por ser “brasileiro” e disso se orgulhando, já tivera problemas com os padres Miguel Giacca e Luiz Gilli, italianos. Em 10 de maio de 1944 Pe. Schwirling escreve que ele foi-se embora para Laguna, pois não aceitou confissões em alemão. Espera agora o Pe. Ludgero Locks: “Sinto-me também velho e doente do coração irregular (legero-devagar – forte – fraco – fechando). Não pode mais andar montado nem de aranha”.

Os últimos anos

Dom Joaquim tinha claro que Pe. Augusto deveria ser recolhido para um merecido repouso. Veio a calhar a Chácara de Azambuja, em Santa Teresinha, onde as Irmãs da Divina Providência tinham residência e lhe oferece o posto de Capelão. Em sete de dezembro 1944 escreve à superiora Irmã Servanda que aceita em tudo as condições para a Chácara de Azambuja e está contente. Em 15 de janeiro Dom Joaquim lhe escreve e pergunta se é possível criar a Paróquia de São Bonifácio sem Anitápolis, e quais seriam os limites definitivos. Era o último consolo para o Padre que percorrera aquelas regiões por 46 anos. E era a despedida.

Em 23 de fevereiro de 1945 fixa residência em Azambuja, Brusque como Capelão das Irmãs na Chácara Santa Teresinha. Anos depois deixou a Capelania e fixou residência no Seminário, pois perdera quase completamente a memória. Tinha apenas lampejos de recordações.

Deus o chamou em 16 de janeiro de 1961 e foi sepultado no Cemitério de Azambuja. Cristo Sumo Sacerdote o coroou com 54 anos de apostolado no Brasil, 89 anos de vida e 66 de sacerdócio.

O povo de São Bonifácio não o esqueceu. Por iniciativa da comunidade e do Pe. Sebastião van Lieshout SSCC, em dois de novembro de 1970 seus restos mortais foram transportados para São Bonifácio.

  1. #1 por Siegfried em 21 de novembro de 2010 - 14:21

    Realmente foi um grande homem.

  2. #2 por Siegfried em 25 de novembro de 2010 - 09:31

    Gostei muito deste texto, moro em São Bonifácio e tenho grande admiração pelos trabalhos executados por Pe. Schwirling, Pe. Deodato Koopmans e Pe. Sebastião van Lishouth, gostaria de saber se os srs. possuem informações sobre Pe. Sebastião.

  3. #3 por Diacono:Permanente Valdemiro Claudino em 31 de dezembro de 2012 - 15:36

    Pe. Sebastião voltou para sua terra natal depois de trabalhar por quase 23 anos no pastoreio na Paróquia de São Bonifácio. Como padre, foi grande imitador do Bom Pastor, atencioso e cativador do povo de São Bonifácio, mereceu ser homenageado com uma placa na gruta do Bom Pastor. A mudança de nome da rodovia SC 431 para rodovia SC 435 é denominada Rodovia Padre Sebastião Antonio Van Lieshou. Faleceu há mais de 12 anos em sua terra natal, cidade de Roterdam na Holanda. Conheci muito bem Pe. Sebastião, pois o acompanhei por muitas e muitas viagens, quando não mais podia dirigir seu “aza branca”, como chamava seu Fiat 147. Muito tempo depois, tinha dois fuscas, um Fuscão e um Fusca 1300.

  4. #4 por Fabiana siqueira em 25 de abril de 2015 - 00:17

    Por favor gostaria de obter informações sobre missionários mirins em Teresópolis…
    Meu filho tem 8 anos e é um evangelizador…

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